sábado, 24 de março de 2012

Vaiar pode? Vaiar não pode?





  Não raro nós temos lido treinadores pedindo para que a torcida apoie e não vaie nenhum jogador. É compreensível. Se eu fosse treinadora de algum time igualmente pediria. Jogadores também apoiam o companheiro que está sendo vaiado pela torcida. Mas se eu fosse jogadora, não me importaria. Como eu sei? Ah, já fui vaiada! Como? Onde? Quando? Por quê? E etc? Vou contar sobre os dias em que vivi como uma esportista e fui... VAIADA!

    Era ano de 1988. Ano olímpico e meu Colégio fazia olimpíadas dentro da escola, separando seus alunos (inscritos) entre o time verde e o time branco, cores da mesma. Como eu era representante de turma e tinha primos e irmão que jogavam, sou de uma família que adora e pratica esportes, me inscrevi com a mesma impetuosidade que me faz escrever sobre o futebol, mas nunca fui de praticar, embora já acompanhasse. 


Como desvalorizamos tanto o vice e a medalha de prata, não é?!


Como fui estimulada pelas colegas de turma, então lá estava eu jogando vôlei, basquete, handebol, ping-pong...(Não tinha futebol feminino). Perdi. Até mesmo no ping-pong, que era meu forte? Perdi. Cheguei a final, tudo bem, mas, perdi. E aquela medalha de prata era uma estampa em neon escrita "quase", uma sensação horrenda e cultural. No vôlei, apesar de ter ao meu lado a Valeska, não fomos longe. No handebol, também perdi. Mas foi no basquete o grande momento de minha vida de esportista: a das vaias!


Não, não tinha (nem tenho) altura para jogar basquete, mas se a ídolo e maior jogadora da época, Hortência, era considerada nanica no meio, eu, mesmo com 10 centímetros a menos, também daria conta do recado jogando de armadora (ah, a coragem da juventude!).  Avisei: não consigo fazer cesta! Mas sabia marcar e armar bem. Tinha bom controle de bola. Avisei: não posso dar toco. Mas conseguia cercar bem. Então, eu armava, Cynthia encestava e - Meu Deus, será que era a Fabrícia?! Eu acho que era sim, a altona que garantia nossa defesa. 


Foi assim que chegamos à final, de forma surpreendente! Foi como chegar à final da Copa do Brasil sendo o Íbis... ou mesmo disputar a decisão do Brasileirão sendo o América. E o melhor de tudo: o time adversário tinha três meninas insuportáveis. Lembro que já no vestiário, só tinha um vestiário para as meninas, elas davam risadas e cantavam vitória, citando ainda a parentela e colegas, especialmente os meninos, que estariam presentes na arquibancada. Entramos com a faca entre dentes e trocaram olhares vermelhos em sangue. Mas, sim, elas eram as favoritas.


Ao entrar em quadra, eu vi que meu primo - professor de educação física da escola - fora o escolhido para apitar o jogo. Todos sabiam de nosso parentesco. Wendell, nosso colega de sala, era nosso treinador. A tática era uma só: bola para Cynthia. Não sei se elas, que representavam o time Verde, relaxaram, ou mesmo se entramos com a macaca, pois que no fim do primeiro quarto, ganhávamos por 7 pontos de diferença. Jogávamos bem e tudo transcorria a nosso favor. Sentimos que dava para vencer. Sentimos elas nervosas e errando mais do que o aceitável. Até aquele lance fatal: puxando um contra-ataque vendo só Cynthia na frente, Danielle (uma daquelas detestáveis) me empurrou por um lado e a outra adversária, Mariana (nojenta!), pelo outro lado, recuperou a bola, aos troncões comigo. Meu primo não deu a falta: - Não foi nada. Caiu de maduro. Levanta! Vai jogar, anda! 


Até hoje eu sou capaz de sentir a intensidade da minha revolta! Machuquei o pulso, porém, nem a dor do tombo eu conseguia sentir, tamanho era o calor daquelas emoções, quais me deixei levar. O jogo prosseguiu e na primeira oportunidade, com um bico em sua canela, joguei Danielle numa altura tão impressionante que ela saiu de maca não só do jogo, da quadra, e sim, do ginásio: "- Ah, agora foi falta?! Em cima de mim, pode. Não é falta. Mas se tocar nas queridinhas a regra muda?!" Questionava o árbitro e primo.  Até que Wendel, meu colega e treinador, me puxou e disse: "- Vai ser expulsa, pô! Pare de histeria!" Obedeci.


O jogo recomeçou e cada vez que eu pegava na bola era uma vaia estrondosa! Senti certa vergonha, mas não deixei transparecer, sorrindo de volta, mas sem deboche.  Comigo, pensei: - Como fui burra! As meninas cresceram na partida e em cada cesta, passavam por mim e falavam com raiva: "-É da Dani!". A vantagem foi diminuindo e comecei a ver tudo ir por água abaixo. Cynthia demonstrava sinais de cansaço, com isso, nossas bolas não caíam com a mesma facilidade. No basquete não podemos somente nos defender e segurar o resultado como no futebol. Elas viraram e venceram por 2 pontos. Uma cesta! Uma cestinha só. 

Em nenhum momento aquelas vaias me intimidaram, pelo contrário, me deram força num momento de cansaço e revolta com a arbitragem. As vaias me deram ainda mais foco. Em vão, verdade. Mas foram os melhores minutos da partida que fiz, especialmente, defensivamente.  As vaias fazem parte. Sempre foi assim em ambiente desportivo. Se eu me importasse com aquela reação, não daria a cara para bater ao decidir participar do evento. Ficaria na biblioteca, como sempre gostei. Eu tinha 12 anos de idade. 


Agora, em pleno 2012, estão querendo proibir a torcida de vaiar um jogador de futebol PROFISSIONAL! Dizem que assim ele fica desestabilizado: mas hein?! Veja se entendi: o camarada de barba feita, ESCOLHE SER JOGADOR DE FUTEBOL, profissão que envolve paixão intensa de seus torcedores, chega ao profissional, mas não pode ser vaiado?! Ah... pobrezinho... Ah... coitadinho... E finalmente, AAAAHHH, não me venham com mais essa agora!!!!! Os torcedores da minha geração já têm que aturar esses caras ruins de bola, treinadores piores ainda com pose de cientistas da NASA, jornalistas prepotentes e soberbos, agora não podemos vaiar?!! VÃO CALAR A BOCA DA ... (dela mesma)! Pronto, falei.



      Abraços, pessoal!
 Da Arquibancada do FutFan, 
Crys Bruno.


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